O Movimento da Reforma Psiquiátrica Brasileira teve início no final da década de setenta, quando vários trabalhadores da saúde mental mostraram-se insatisfeitos com as condições de trabalho e com a atenção desumana oferecida aos portadores de transtornos mentais nas instituições manicomiais. Para tornar públicas as irregularidades, as situações de violência e a opressão de tais centros, várias denúncias foram feitas na mídia e debatidas em eventos científicos da área. Em 1987, no II Congresso Nacional dos Trabalhadores da Saúde Mental (Bauru/SP), nasce o Movimento da Luta Antimanicomial, com o Lema "Por uma sociedade sem manicômios", símbolo da opressão, massificação asilar e exclusão social. Neste evento, o "18 de maio" foi instituído como o Dia Nacional da Luta Antimanicomial, para criar um espaço de reflexão sobre os avanços, os desafios e as barreiras da Reforma Psiquiátrica Brasileira e sobre as políticas públicas em saúde mental. Desde então, esta data é comemorada em todo o País e conta com a participação dos profissionais da saúde mental, dos portadores de transtornos mentais e de seus familiares, de intelectuais, de estudantes e de pessoas interessadas num tratamento mais humanizado em saúde mental. Uma conquista importante do movimento foi a aprovação da Lei nº 10.216/01, em abril de 2001 (MS, 2001), que dispõe sobre a substituição gradual do tratamento manicomial tradicional por uma rede diversificada de serviços de saúde mental, sobre a proteção dos direitos dos portadores de transtornos mentais e sobre os diferentes tipos de internação (voluntária, involuntária e compulsória) especificando as condições para a sua realização. Atualmente, o tratamento dos portadores de transtornos mentais graves conta com uma rede diversificada de serviços de saúde mental, sendo os CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) nas suas diferentes modalidades de atenção o seu eixo norteador. Dessa forma, o número de leitos para internação psiquiátrica diminuiu em todo país para dar lugar a criação dos diferentes tipos de CAPS, com tratamento especializado aos transtornos mentais graves (CAPS), aos usuários de álcool/drogas (CAPS A/D) e aos transtornos associados à infância/adolescência (CAPS I). Segundo o Relatório do Ministério da Saúde, existem no Brasil 822 CAPS I, 431 CAPS II, 63 CAPS III, 272 CAPS A/D e 149 CAPS I e 5 CAPS A/D III, totalizando1742 serviços. Outro avanço foi a criação do Programa de Volta pra Casa, através da Lei nº 10.708 (MS, 2003), que objetiva a reintegração social dos portadores de transtornos mentais, egressos de longas internações, mediante pagamento do auxílio-reabilitação para as famílias dos portadores destes transtornos. Estima-se que cerca de 15.000 usuários do SUS são beneficiários do auxílio. Outro dispositivo criado pelo Ministério da Saúde foi o Serviço Residencial Terapêutico (SRT), para garantir o direito a moradia das pessoas egressas de hospitais psiquiátricos e auxiliá-las em seu processo de reintegração na comunidade. Foram implantadas 625 casas no Brasil, com 3.470 moradores em 2011 (BRASIL, 2012). Apesar destes e de outros avanços, a Reforma Psiquiátrica Brasileira é um processo inacabado e apresenta desafios importantes, tais como: o curso desigual da reforma, com o maior desenvolvimento em regiões do País mais ricas; a diminuição de leitos psiquiátricos para internação e a criação insuficiente dos dispositivos extra-hospitalares (CAPS, Recursos Residenciais, Programas de Reabilitação Social, Unidades de Internação nos Hospitais Gerais, etc.); a distribuição desigual dos Fundos Públicos destinados somente aos recursos extra-hospitalares ou às internações manicomiais; o despreparo e a falta de capacitação dos profissionais da saúde mental; a inadequação da assistência nas unidades psiquiátricas dos Hospitais Gerais que prioriza o tratamento de casos agudos em detrimento da atenção aos transtornos crônicos e graves; a falta de serviços de moradia, reabilitação e reinserção social. Esta atenção insuficiente e inadequada somada ao estigma associado aos transtornos mentais representam barreiras importantes no alcance dos objetivos da Reforma Psiquiátrica. Desta forma, o tratamento humanizado de base comunitária e a integração social plena dos portadores de transtornos mentais na sociedade permanecem ameaçados. Importante ressaltar que o Conselho Federal de Psicologia (CFP) reitera o seu apoio aos usuários, trabalhadores e familiares do Movimento Antimanicomial em todo o país na luta por uma atenção em saúde mental mais humanizada e inclusiva. Alessandra de Arriba Rossetto Dra. em Psicologia Clínica e da Saúde (Universidade de Santiago de Compostela/Espanha)